Fortalecimento
egoigo observado en idosos
submetidos a psicoterapia grupal en clínica escola (1) (2)
Mónica
Americano Leite Heriques
mar.vir@zaz.com.br
Resumo:
O presente trabalho se refere ao atendimento psicoterápico a um grupo de terceira idade. Teve como objetivo criar condições para que os participantes expusessem conflitos e ansiedades decorrentes da idade avançada. Trata-se de um grupo constituído por 7 pessoas (6 mulheres e 1 homem), com mais de sessenta anos, que se reuniram durante um ano, uma vez por semana, com sessões de hora e meia, nas dependências da Clínica Psicológica da PUC-SP. Constatou-se que os participantes encontram meios de elaborar alterações, como mudanças orgânicas e falecimento ou afastamento de entes queridos, no desenvolvimento da possibilidade da escuta do outro. A vivência de impotência frente à explicitação destes conteúdos, manifesta-se através de estados depressivos grupais: faltas, sono, conversas paralelas, falas compulsivas. O grupo psicoterapêutico para idosos propiciou o fortalecimento da auto-estima pelo intercâmbio de vivências, reflexão dos conteúdos individuais e coletivos e possibilidade de revisão e elaboração de projetos pessoais.
Palavras-chave : envelhecimento, depressão, grupos, psicanálise.
Histórico do Atendimento
O atendimento em psicoterapia grupal para idosos teve início no ano de 1989 na Clínica Psicológica "Ana Maria Poppovic"- PUC-SP como Complementação Curricular para psicólogos eu médicos.
O presente trabalho teve duração de um ano, com início em agosto de 1995
E término em julho de 1996. Trata-se de um grupo psicoterapêutico constituído por seis mulheres e um homem com mais de sessenta anos de idade, que se reuniam uma vez por semana, com sessões de uma hora e meia de duração. O estado civil dos participantes variava : das mulheres, duas eram viúvas, uma separada e três casadas. O homem era casado. Teve como objetivo criar condições para que as pessoas expusessem seus conflitos e ansiedades acentuados com o avançar da idade. A partir das interpretações e intervenções da psicoterapêuta e das constantes colocações apresentadas pelos componentes do grupo, a psicoterapia desenvolveu sua trajetória.
No início do processo, houve desistência de algumas participantes : C., após dois meses teve três faltas consecutivas, sendo portanto desligada ; A. , que após duas sessões conseguiu recolocação profissional e F. que desistiu do atendimento após o primeiro encontro.
Após férias de quinze dias, foram reiniciadas as atividades e convocadas mais três participantes para vagas remanescentes. CL.e L. vieram de um grupo que encerrou o trabalho em julho de 95 e J., participante pela primeira vez de uma psicoterapia. A entrada desses novos participantes contribuiu para enriquecer a troca de experiências e coesão grupal.
Características do Grupo Atendido
O estado depressivo em que se encontravam os pacientes caracterizou o grupo desde o início de trabalho psicoterapêutico.
Inicialmente as queixas eram de dificuldade no relacionamento familiar e/ou ausência de atividades, morte do cônjuge e filho, resultando baixa auto-estima, solidão e doenças somáticas. Através dessas queixas apresentadas concluímos tratar-se de um grupo com características depressivas. Os efeitos da depressão: foram observados através de relatos, faltas, conversas paralelas e sono, durante as sessões. No decorrer da psicoterapia foram expressos outros sintomas, redução da agressividade, perda de apetite, insônia ou sono excessivo e alterações fisiológicas.
A depressão é um distúrbio psicológico grave que para a maioria das pessoas, somente é identificada num momento de sofrimento extremo. Os participantes do grupo sentiam-se inúteis e culpados por sua deficiências, sem vontade de agir, sem interesse pelo mundo e acreditando nada poderem fazer para alterar essa situação.
A Depressão em Idade Avançada, segundo a Psicanálise
Pensamos a depressão em idosos como decorrente das inúmeras perdas pelas quais os indivíduos passam ao longo da vida. Essas perdas vão se acumulando e, de acordo com a estrutura da personalidade de cada um, desenvolvem sentido próprio. O desequilíbrio interno, resultado da dificuldade e/ou incapacidade de compreensão e assimilação de um cotidiano vivido como ameaçador, contribui para o isolamento social.
Caracterizar as perdas, torna-se necessário para maior compreensão acerca do desequilíbrio que pode se instalar. As limitações físicas, naturais ao processo de envelhecimento, vêm somar-se àquelas que a sociedade impõe, reforçando a imagem de "velho sucata". Sabe-se que a falta dos entes queridos (pais, marido, filhos) desencadeiam estados de profunda solidão e tristeza, assim como a mudança de antigas posições pelos com as quais ocupou-se ao longa da vida: aposentadoria (principalmente para homens); casamento dos filhos; sinais do avançar dos anos - cabelos brancos, diminuição da agilidade física. Elaborar estes fatores depende das formas alternativas de buscar compensações que tragam satisfação, além dos recursos internos de cada um. A quantidade e qualidade destas perdas terão repercussões nessa etapa da vida, pois quando não elaboradas povoam e desequilibram a mente, podendo resultar em baixa auto-estima.
Segundo Salvarezza (1991), existem outros fatores, para além das perdas que enfraquecem a auto-estima, e que diz respeito a cultura vigente atual.
Esta, é dominada pela rapidez nas mudanças técnológicas levando os sujeitos à competição desenfreada onde - quem sabe mais produz mais! Não havendo lugar para "os mais fracos". Assim, a atitude da sociedade se converte, direta, ou indiretamente, em segregacionista, não só em relação ao velho, mas a partir do momento em que o sujeito começa a envelhecer, de tal maneira que ele deve adaptar-se a suas próprias mudanças. Sente que muitas coisas deixam de lhe pertencer, e que já não pertence a essas mesmas coisas. Percebe que a distância com a geração mais jovem se amplia, criando certo desajuste entre - o que o sujeito é capaz de fazer, e a visão de si mesmo, que o mundo externo lhe devolve. Mas o problema não depende só da atitude do outro, mas de como o indivíduo a interioriza, a maneira como cria contradição entre seus desejos e sua reticência na busca de sua satisfação, ou quanto isto não é realmente mais possível. A expressão deste conflito se traduzirá por um certo retraimento na relação com o mundo externo, podendo se apresentar das mais variadas formas, aumentando a relação reflexiva com seu mundo interno. Ativando, notavelmente as recordações do passado. Salvarezza (1991), utiliza o termo " interioridade"( p. 107 ), para caracterizar este movimento em direção ao interior do indivíduo, afirmando ser um processo " universal " (p.107) . Assinala também, que no momento em que se instaura o conflito entre os desejos e a impossibilidade de satisfazê-los, decorrência de seu processo de envelhecimento, se produz um aumento da "ïnterioridade", que levará o sujeito a transitar por seus vestígios mnêmicos, com resultados diversos.
Manter vínculos sociais que valorizem esse sujeito, colaboram na manutenção da auto-estima e consequentemente afastam possíveis fantasias de desestruturação psíquica, concomitante às perdas sociais e físicas.
(Bleichmar, 1983, apud Salvarezza, 1991, p/61) sustenta que : "a depressão é um estado que tem como condição a perda de uma relação objetal, na qual o conteúdo ideativo é o de que esta perda torna impossível a realização de um desejo ao qual se está intensamente fixado".
Como destaca Salvarezza( 1991, p.63) é complicado conceituar a depressão, pois esta reside numa diversidade de acepções (a qual pode ser considerada como sintoma, síndrome ou enfermidade). Bleichmar( 1983, p.94) propõe que devemos "entender os quadros psicopatológicos tal como se apresentam nos indivíduos concretos, como uma articulação de estruturas, de modo que, a depressão poderá ter lugar em qualquer tipo de personalidade; quer dizer articular-se com estruturas de personalidade histérica, obsessiva, fóbica, etc.."
Luto e Depressão
Sendo a depressão a perda de um objeto que impede que o indivíduo se desenvolva, Bleichmar (1983), a maioria delas está relacionada com uma experiência passada, que é vivida como perda, além das modificações evidenciadas corporalmente como: diminuição da acuidade visual, auditiva, da mobilidade, de antigas posições sociais, morte de amigos e cônjuge. Em face disso, há dois fatores relevantes, conforme afirma Salvarezza (1991, p.65), "o motivo perdido e a reação desmedida (luto). "
É notório que todos os indivíduos, desde a concepção enfrentam, ao longo da vida, situações de perda. Isto não deveria ter conotação negativa, visto que, faz parte da condição humana, pois toda aquisição de novas relações, situações, idéias, implica em alguma perda - parcial ou total, entretanto, de acordo com Salvarezza (1991) , não existe um único tipo de resposta, mas ao menos duas: "normal e desviante do normal". Uma reação normal, ou mais adequada ao luto ou a falta de um objeto, é verificar que a vontade de satisfazer desejos e necessidades com ele já não é mais possível. O trabalho de luto será, portanto, desinvestir este objeto, buscando novas relações.
Conforme Salvarezza (1991 p.70), "o luto normal é o trabalho de elaboração de uma perda, o luto patológico se caracteriza pela dificuldade de aceitar esta perda e por uma reação desmedida". Para tanto, é necessário que o indivíduo tenha incorporado uma série de condutas, inclusive acerca da capacidade de reagir a frustração, podendo restabelecer novos vínculos.
O luto patológico, de acordo com Salvarezza (1991, p.71), "segue uma evolução escalonada similar ao que foi descrito a propósito do luto normal, mas sua qualidade é totalmente distinta." Destaca-se os transtornos somáticos a procura desesperada pelo médico. Os pacientes queixam-se de diversas doenças sem poder estabelecer conexão entre elas, e entre o motivo que as desencadeou, mascarando-as. De acordo com Salco (1993, p.48) " os idosos negam estarem deprimidos e não se queixam de tristeza ou disforia. Em lugar disso, apresentam queixas somáticas proeminentes como dores crônicas, distúrbios gastrintestinais, cansaço, fraqueza, distúrbios de memória e diminuição de energia." Geralmente estes sintomas encobrem a verdadeira causa da depressão, que nem sempre é tratada, levando o indivíduo a um sofrimento indefinido.
A partir de estudos realizados por Freud em "Luto e Melancolia" (1915), pode-se determinar com maior precisão quais os fatores psicológicos inconscientes que classificariam as depressões, até o momento denominadas endógenas. Com efeito, percebeu-se que o desenvolvimento maior nesta área propiciou um diagnóstico mais preciso, impedindo que elas passassem despercebidas, ou mascaradas - processo de depressão no idoso. Podemos contar, atualmente com uma teoria e uma técnica que nos permite questionar a respeito da causalidade dos fatos e nos aprofundar na investigação dos aspectos ainda desconhecidos.
Resultados
Com o decorrer do trabalho, foram observados o intercâmbio de vivências que proporcionou ao grupo a descoberta de temáticas comuns: "Para mim foi um alívio participar do grupo, porque eu percebi que meu problema é pequeno perto do problema dos outros" (sic); contribuição através de experiências relatadas pelos outros, "Você sempre viveu para seu marido, agora vive para seu filho... e você? (sic) revisão dos projetos pessoais, "Meus filhos já estão crescidos, agora preciso pensar em mim" (sic); ampliação da escuta, "Não adianta vir aqui só ouvir o que vocês dizem. Vocês mostraram que há outras possibilidades. Só que a gente precisa ir para casa, pensar e fazer" sic); reflexão dos conteúdos particulares, "Estou me analisando melhor agora e vendo como era pura e ingênua...não tenho mais aquela mágoa dentro de mim" (sic) e identificação de movimentos internos que se reproduziram dentro e fora do grupo, "Fico esperando alguém vender meu crochê, se a pessoa não consegue, nada posso fazer" (sic). Os pacientes puderam investigar a origem dos estados emocionais, desenvolvendo o fortalecimento da auto-estima.
A entrada de um participante masculino, desencadeou nova dinâmica no grupo e as demais participantes, passaram a apresentar mudanças de lugar, falas compulsivas e relatar sonhos com homens. Identificaram-se com esse novo participante à medida que ele expunha seus conflitos, permitindo que pudessem rever suas relações familiares e ou conjugais. Essa troca de experiência entre homens e mulheres, proporcionou mudanças significativas nos pacientes. Por exemplo: puderam verificar a posição masculina diante dos conflitos diários mais comuns num relacionamento conjugal.
Quanto ao atendimento em grupo à idade avançada, podemos destacar benefícios diretos: a possibilidade de viverem com maior prazer e bem estar cotidiano, pois realça a auto estima e fortalece a autonomia; os benefícios indiretos aparecem na possibilidade de re-verem/refletirem antigos relacionamentos familiares, além de construir outros mais estáveis. O fato de tornarem-se mais cônscios de seu papel na sociedade, e consequentemente mais participativos em diferentes momento do cotidiano, parece-nos significativo.
Discussão
Os achados do presente estudo evidenciaram que, diante de fatores que contribuem para o aumento da depressão em idosos tornando-os mais vulneráveis à sintomatologia depressiva, tais como: aumento de doenças físicas perdas sucessivas de vínculos afetivos baixa aposentadoria sentimento de insuficiência e anonimidade isolamento social; foram se "diluindo" através do processo psicoterapêutico grupal. Esta modalidade de atendimento propiciou várias mudanças e reflexões.
Se a queixa entre os participantes era de isolamento social, através do relato de experiências pessoais, e da possibilidade de expressão destes sentimentos no grupo, sentiram-se alíviados percebendo que não estavam sózinhos com seus problemas , e que estes, eram compartilhados por todos .
Sentindo-se incapazes e anônimos e, consequentemente com a auto-estima baixa , perceberam que , oferecendo apoio e contribuição na resolução dos conflitos trazidos por cada um , desenvolviam um sentimento de utilidade, elevando a auto-estima.
A investigação dos estados emocionais era possibilitada por uma profunda observação da posturas de cada paciente. Como se apresentavam diante das simpatias, antipatias, similaridades, inveja, agressão, competitividade que traziam do grupo familiar primário. Isto significa que o grupo psicoterapêutico propiciou uma reedição deste primeiro e mais importante grupo - o familiar, em que muitos indivíduos carregam ao longo da vida, experiências negativas no relacionamento com pais, avós e irmãos, de acordo com Vinogrodov, Yalom (1992).
Outro fator observado, foram as experiências pessoais relatadas contribuindo para a identificação de outras afecções psíquicas não diagnosticadas até o momento, como o luto patológico e melâncolia, por exemplo.
A troca de experiências entre os participantes, permitiu a cada indivíduo a possibilidade para identificar e mudar algum comportamento que se apresentava inadequado, pois o grupo apontava distorções interpessoais com agilidade, desenvolvendo em cada participante, um senso de responsabilidade por sua imagem diante dos outros e para si mesmo. Deste modo, o grupo ofereceu, a seus participantes, aprendizagem, mudança e percepção dos problemas individuais , e que estavam ao alcance de cada indivíduo.
Notas
1 Este trabalho foi apresentado como conclusão do atendimento em grupo à 3a fase da vida, oferecido pela Clínica Psicológica da PUC "Ana Maria Poppovic", em complementação curricular sob supervisão da Prof. Ruth G. da Costa Lopes 1995/96.
2 Foi apresentado em dois Congressos : 48o Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC, julho 1996, sessão de posters, e no XXVI Congresso Interamericano de Psicologia, julho 1997, em mesa redonda "Atendimento em grupo de idosos e a pessoas de meia idade. Relato de experiências"
Referências Bibliográficas
1. BLEICHMAR, H. Depressão : um estudo psicanalítico. Trad. de Maria Cecília Tschiedel. Porto Alegre, Artes Médicas, 1983.
2. SALVAREZZA, L. Psicogeriatria - Teoria e Técnica. Buenos Aires. Ed. Paidós, 1991.
3. SCALCO, M.Z. Depressão no idoso. In Psiquiatria e Psicologia no Hospital Geral : A Clínica das Depressões. Editor Renério Fragua Jr. etlal; revisão Valeska P. Sarti. SP, Asturias, 1993.
4. VINOGRADOV, S. - Psicoterapia de grupo : um manual prático / Sophia Vinogradov, Irvin D. Yalon; Tad. Dayse Batista , Porto Alegre, Artes Médica, 1992.