Nas
Encruzilhadas do odio
Paranoia .
Masoquismo - Apatía
Micheline Enriquez
"Nas Encruzilhadas do Ódio - Paranóia-Masoquismo-Apatia"
de Micheline Enriquez - Tradução de Martha Gambini
ISBN 85-7137-147-4
232 páginasA observação clínica revela que onde se cruza com o ódio há inelutavelmente um excesso de sofrimento corporal e psíquico. O sofrimento e o ódio se juntam e cada um torna-se causa do outro; conseqüentemente, a relação com o outro se estrutura segundo o modo perseguido-perseguidor.
A adoção de posições paranóicas, masoquistas ou "apáticas" são igualmente formas de elaboração desse "complexo ódio-sofrimento".Os paranóicos e os masoquistas, que apresentam, além disso, numerosas afinidades eletivas, erotizam o ódio e o sofrimento, deles se alimentam e encontram aí fontes para suas identificações e escolhas de objetos. Os "apáticos", por outro lado, se interditam para sobreviver a todo afeto e pensamento sobre o ódio, e recusam ao outro o poder de lhes fazer sofrer. Nas encruzilhadas do ódio é um clássico da psicanálise e propõe uma exploração teórica e clínica dessas diferentes atitudes mentais. Face a elas, até que ponto e em que condições a análise é possível?
Sumário do Livro
Prefácio
Primeira Parte - O ódio paranóico
- Capítulo 1 - Vivência apolíptica e fantasia de indestrutibilidade
- Capítulo 2 - A feminilização de Schreber
- Capítulo 3 - O ódio do pai na paranóia feminina
Segunda Parte - O ódio masoquista
- Capítulo 1 - As formas clínicas de relação com a causalidade: causalidade e culpa
- Capítulo 2 - Sobre a gênese de um caso de masoquismo perverso
- Capítulo 3 - As afinidades entre paranóia e masoquismo
- Capítulo 4 - Do corpo em sofrimento ao corpo de sofrimento
Terceira Parte - Formas de contenção do ódio e economia de sobrevivência
- Capítulo 1 - A escritura representativa
- Capítulo 2 - A prova de força de inércia
- Capítulo 3 - Harmonia e desarmonia no tratamento
- Capítulo 4 - Desinvestimento e ódio de transferência
À guisa de conclusão
Referências
O ódio é afeto tão primitivo quanto o amor. Fonte de representações e desejos inconscientes, expressão mais ou menos bem temperada do narcisismo, concorrendo com o apego experimentado em relação a um mesmo objeto, ou ainda característico do fundamento das pulsões de morte, o ódio apresenta múltiplos semblantes. Pode ser deduzido tanto da psicopatologia da vida cotidiana quanto do prazer do exercício do poder e da submissão. A disposição interior para buscar a morte, assim como a agressividade assassina contra um adversário designado, constituem forças de destruição que realizam sua obra no psiquismo individual e na comunidade humana.
Resta para todos, caso se queira tentar viver, negociar a economia desses movimentos pulsionais destruidores de si e do outro. A intensidade com que eles se manifestam em certas problemáticas psíquicas (situadas todas fora do campo da neurose) faz com que estas se limitem a se organizar em função de sua pressão constritiva.
Este livro, um verdadeiro clássico da psicanálise, considera o destino e os avatares do complexo ódio-sofrimento em três campos clínicos diferentes, mas nos quais sua negociação, os compromissos e as criações psíquicas que pode provocar são as condições únicas de acesso a posições identificatórias e a um espaço psíquico capazes de opor uma barreira parcial à irrupção de forças que ameaçam a vida física e mental.
As duas primeiras partes desta obra são consagradas à paranóia e ao masoquismo, entidades clínicas conhecidas, teorizadas pela psicanálise e que apresentam entre si numerosas afinidades eletivas.
Em oposição às organizações paranóica e masoquista, ambas exaltando o ódio e o sofrimento, alimentando-se deles, colocando-os constantemente em cena e dando-lhes sentido, a terceira parte do livro delineia o contorno de um outro conjunto clínico que poderia se caracterizar pela adoção de posições inversas, ou seja, apáticas com respeito ao ódio e ao sofrimento.
A apatia conota no sujeito que a ela recorre como sistema defensivo, a recusa de que o outro tenha o poder de fazê-lo sofrer. Não experimentar o ódio e o sofrimento, contê-lo a qualquer preço, tornam-se então a condição de sobrevivência.
No decorrer deste texto percebe-se que a autora deu, o máximo possível, a palavra a seus pacientes, tentando restituir a tonalidade e a espessura da relação singular que se estabeleceu entre eles. Com isso, ela espera que o leitor possa avaliar a intensidade das forças psíquicas contraditórias e a violência dos afetos que atravessam o campo do tratamento e dolorosamente colocam à prova o analista e o analisando.
Micheline Enriquez, psicanalista do Quarto Grupo desde sua fundação em 1969, foi autora de numerosos artigos publicados na revista Topique e exerceu a psicanálise em Paris.