Carta de S. Malvezzi

Deputado Eber Silva,

Estudei o projeto 3.944/2000 de sua autoria e tomo a liberdade de lhe comunicar minhas reflexoes. Entendo sua limitacao de tempo, por isso, neste momento, restrinjo-me as conclusoes mais gerais, porem estou a disposicao para apresetnar o conteudo de uma analise mais consistente

O projeto revela ignorancia sobre a evolucao recente das ciencias comportamentais e das profissoes, alem de pobreza na reinstitucionalizacao de um instrumento de saude que carrega em sua propria condicao ontologica, enorme potencialidade de cura e de mutilacao. Lamentavelmente, embora possa nao ser, mas parece ser mais um casuismo, desses que denigrem a instituicao Congresso Nacional porque revelam a estreiteza como problemas graves sao decididos, em funcao de uma pequena contigencia historica. O projeto 3.944/2.000, coloca a re-institucionalizacao dos profisisonais de saude no contrafluxo da historia.

Ao inves dele aproveitar o atual pluralismo das ciencias comportamentais para enriquecer nossa capacidade de producao de saude, ele cria medidas concretas de desintegracao. A leitura do projeto lembrou-me o ano de 1964, quando os medicos defendiam uma separacao entre a psicoterapia medica e a psicologica. Algo que, no presente momento historico, nao se encontra um unico texto que defenda essa posicao. Sequer isso e umproblema controvertido. Hoje, todos trabalham juntos, nao apenas nos centros de saude, mas tambem nas fabricas (celulas de manufatura) e assim deveria ser tambem o trablaho no congresso nacional. Na institucionalizacao profissional, as fronteiras estao sendo derrubadas como foi o muro de Berlim e caminha-se para a especializacao flexivel. Por que retornar ao enrijecimento de fronteiras, quando as fronteiras, no mundo complexo do presente momento historico deixam de ser o que separa para ser uma interface de integracao. Qualquer analise do projeto, por mais simples e pobre que seja, revela, mais uma vez, a estreiteza da solucao. Entendo as dificuldades de se encontrar uma resposta para a re-institucionalziacao profissional dos agentes de saude, porem facilitar a sua banalizacao e' alinhar-se com os vendilhoes do Templo de Jerusalem, que foram expulsos a chicotadas, tao grave era o mal que eles geravam.

Caro deputado, decidi lhe escrever porque omitir minha opiniao nesse projeto (sou psicologo e no momento trabalho como Visitng Professor da University of Lancaster, com especialidade em identidade e institucionalizacao profissional) seria colocar-me alinhado aos vendilhoes e, pela omissao, colaborar com a mercantilizacao de um importante recurso de saude.

Hoje, passei o dia preparando um seminario que darei para academicos e pesquisadores na proxima quarta feira. Estou resistindo a tentacao de apresentar seu projeto como exemplo de um trabalho causista e que danificara por muitos anos a producao de saude no Brasil. Antes de decidir se incluo ou nao o projeto 3.944/2000 no conteudo do seminario, gostaria de escutar seus argumentos. Pode ser que haja ideias novas sobre a institucionalizacao das profissoes de saude e das ciencias comportamentais e que ainda nao sejam de dominio dos estudiosos.

Ainda, ao ler seu projeto, minha memoria fez imediata associacao com um conhecido artigo esrito por Chris Argyris, ha uns 10 anos, entitulado "skilled incompetence". Permita-me, a titulo de "feed back" lhe dizer que tenho firme conviccao (e argumentos, se for necessario) de que a consequencia natural da aprovacao desse projeto, sera a producao em massa, de incompetencia habilidosa.

Tenho certeza que nao e essa sua intencao, ao contrario, creio que voce deve lutar contra essa tragedia. Reveja o projeto. Estou a sua disposicao, embora distante, aqui em Lancaster, para um dialogo. Boa Pascoa

Sigmar Malvezzi
Department of Behaviour in Organisations
University of Lancaster
Lancaster, LA1 4EE
United Kingdon

16/04/2001

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