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Crónicas

XI Encontro Brasileiro do Campo Freudiano:
um relato

Durval Mazzei Nogueira Filho.
Membro da Seção São Paulo da EBP
Coordenador do Núcleo de Pesquisa em Toxicomania do IPP-SP.

O encontro do campo freudiano brasileiro pautou-se pela multiplicidade de atividades. Contou com os Seminários de Eric Laurent, com as plenárias discutindo termos do discurso psicanalítico contemporâneo ( o Real, a Letra e o Novo Amor), com a Conversação a respeito da pertinência do discurso psicanalítico nas Instituições e na prática de consultório e com a sessão "poster". De todas essas atividades a que me pareceu não responder como pretendido (testemunho de um repórter inexperiente) foi justamente a sessão "poster". Não presenciei a apresentação de nenhum deles, incluindo a não apresentação formal do "poster" por mim enviado. O chamado específico para essa atividade foi insuficiente. Talvez a tentativa de mimetizar práticas usuais de Congressos médicos ou psicológicos requeira uma reflexão maior, não obstante a bela apresentação plástica dos trabalhos.

Aliás este é um ponto interessante. A sessão "poster" supõe, antes de tudo, a explicitação imagética de um trabalho, de um projeto, de uma pesquisa. E é, como dito, figura carimbada nos encontros e congressos médicos e psicológicos. E contrasta com o espírito – bem psicanalítico – do expediente da Conversação. Vale salientar que a minha participação na Conversação mereceu um reparo do diretor da mesa, Antônio Beneti, exatamente por ler um trecho ao invés de "conversar ". A conversa implica em fala livre e a possibilidade de um saber produzir-se ali, no ato das palavras articuladas. Para além ou aquém de qualquer exigência de verificabilidade. Um estilo de constituir saberes por uma via não empírica, portanto. Este é um breve comentário a respeito que a recepção, em encontros de psicanalistas, de uma atividade não psicanalítica, não discursiva, como é o "poster" não obscurece a Conversação, Psicanálise em extensão no melhor estilo.

Os "posters" apresentados foram: "EU não sei beijar" por Francisco J. R. Goyatá, "Qual a escuta psicanalítica da criança no novo milênio? Qual criança?" por Marta Monteiro, "Amor e Dor: Rima do Gozo?" por Vera L. Besset, "L’objet trouvé: a experiência surrealista do objeto" por Lúcia G. Santos, "Psicanálise e Formação de professores" por Nanci M. Mitsumori e colaboradores do Núcleo de Pesquisas sobre Psicanálise e Educação do IPP-SP, "Psicanálise e Educação inclusiva" por Marisa V. F. C. Nubile e colaboradores, "Pós-modernidade e Psicanálise" por Yára Valione e colaboradores, "Novo amor: resposta às novas formas de sintoma?" por Lilany V. Pacheco, "Prevenção em Toxicomania" por Durval M. Nogueira Filho e colaboradores do Núcleo de Pesquisa em Toxicomania do IPP-SP e "Um amor sob medida" por Mônica Rolo.

Como informação, então, foram duas sessões de Conversação nas manhãs de 20 e 21 de abril. A primeira delas versou sobre " O trabalho do psicanalista nas Instituições" e teve a presença de analistas de todas as longitudes brasileiras. Da Paraíba ao Paraná. As apresentações variaram entre discursos conceituais em "Psicanálise e Instituição" e "O Ensino da Psicanálise na Universidade: algumas reflexões sobre uma aporia" e discursos sobre as vicissitudes da direção da cura psicanalítica no interior das Instituições médicas. Assim foram as falas nomeadas "Imagem e perversão em um caso de psicose", "Numa Instituição: as estratégias para uma direção da cura", "O psicanalista na Instituição" e "O desejo do analista e as Instituições". Estas falas representaram, respectivamente, Durval M. Nogueira Filho, Maria de Souza, Simone D. Souto, M. Luiza Miranda, M. do Rosário C. do Rêgo Barros e Margarida Assad. A mesa teve como coordenador Antônio Beneti e debatedores Ariel Bogochvol e Iordan Gurgel.

A Segunda sessão de Conversação versou sobre "O trabalho do psicanalista no consultório". Nesta sessão, melhor do que na primeira, os objetivos da Conversação foram mais plenamente alcançados. Digo assim, pois a participação da platéia e dos componentes da mesa foi mais equilibrada. A sessão anterior centrou-se excessivamente entre os debatedores e a mesa. Novamente, a extensão geográfica brasileira esteve presente. De Pernambuco a São Paulo. Cada um dos representados pela fala apresentaram trabalhos que demonstraram a preservação da fecundidade da Psicanálise na extimidade do consultório, o mesmo lugar onde Freud deu passos decisivos para a fundação da disciplina: a solidão do gabinete. Solidão singular, decerto, dada a multidão de vozes, pessoas, imagens que freqüentam cada sessão. Um peculiar encontro a dois (mil). A mesa foi coordenada por Célio Garcia, cuja simpatia e habilidade concorreram para que a Conversação se desenvolvesse com mínimos obstáculos. Os debatedores foram Bernardino Horne e Carlos Genaro G. Fernandéz. E a diferença entre Psicanálise e Psicoterapia, "sem demérito ou mérito para nenhuma das duas" – na frase de Fernandéz, coroou os debates. Os representados pela fala foram: Cristina Drumond com "Foi a solidão", Marta Monteiro com " Na rua dos bobos, número zero", Carlos E. Leal com "O traumatismo precoce como dimensão do tempo na criança", M. Helena B. Bogochvol com "Do necessário ao contingente", Cláudia Murta com "O amor como veículo de transmissão " e Gisella S. Lopes com "O trabalho do psicanalista no consultório – laço do desejo do analista com a transferência".

As plenárias foram três. Ocuparam as tardes dos dias 20 e 21 e a manhã de domingo, dia 22. Sob os títulos "O Real", A Letra" e "O Novo Amor’, declarava-se a possibilidade de circunscrever "o mais forte do que eu". Esta expressão, nome do XI Encontro, se bem que presente desde as primeiras formulações freudianas, onde a pulsão, seu lugar-tenente, a memória que não é inerte, a substância do sintoma apontaram, desde sempre, que há algo material, inconsciente, sem possibilidade associativa, mais forte que eu. Esta presença perene do mais forte que eu no discurso analítico – apesar dos halterofilismos egóicos dos norte-americanos – não nega a configuração particular que o presente momento cultural põe em cena. Nesses tempos de discurso unificador, globalizado e paradoxalmente liberticida que traz como marca subjetiva, conseqüência da cientificização do cotidiano, a possibilidade do "mais forte do que eu" encontrar a resposta " não tenho nada com isso" e o Outro permanecer silente e sem memória. Assim, as diversas conferências, nas três plenárias, engalfinharam-se com a tarefa de responder a pergunta de Jorge Forbes: "Que clínica propicia um "saber fazer" com o "mais forte que eu"?". Nestas condições: sem Outro e sem a garantia que a metáfora paterna trazia.

As mesas das plenárias foram assim distribuídas: "O Real" com Marcelo Veras, Marcus A. Vieira, Jésus Santiago e Márcio P. S. Leite que apresentaram "mais forte que eu...o despertar", "O real da paixão", "Novos sintomas mais forte que eu" e "Mais forte que eu e o gozo"; "A Letra" com M. Josefina S. Fuentes, Márcia Rosa, Marcela Antelo e Ana L. L. Holck que apresentaram "O exílio d’A Mulher", "essas coisas absolutamente heteróclitas", "Krytonita, teu nome é mulher" e "Mais forte que eu, todo sobre mi madre"; "O Novo Amor" com Nora Gonçalves, Lêda Guimarães e Elisa Alvarenga que apresentaram "Um amor fora dos limites da lei", "De uma Escola parceiro – sintoma a um amor mais digno" e "A causa na transmissão do passe". Os que presidiram as plenárias foram, respectivamente, Sônia Vicente, Gilberto R. da Fonseca e Carlos A. Nicéas. Os debatedores Sandra A. Grostein e Romildo do R. Barros. Que as respostas tenham satisfeito a pergunta. Hiâncias obrigatórias que desmantelam a certeza do determinismo são contadas.

E, mais ainda, o XI Encontro contou com a presença de Eric Laurent. Eric Laurent esteve presente na abertura do Encontro, tendo a companhia de J. Forbes. "Lacan: o analista do futuro. Cem anos de Lacan", mote das conferências, teve o preciso intuito de homenagear o centenário de nascimento de Jacques-Marie-Émile Lacan transcorrido em 13 de abril de 1901. A chance da Psicanálise de orientação lacaniana marcar os trilhos que os psicanalistas devem seguir no futuro correspondeu à tônica dos pronunciamentos. A presença na platéia de analistas convidados, praticantes de outras orientações, foi uma nota interessante. A ausência de debates em seguida às apresentações poderia ter sido um momento alto do Encontro. Entretanto, não aconteceu. O coquetel chamava a todos para outra ordem de comemoração.

Eric Laurent também foi o responsável pelos Seminários que encerraram os trabalhos nas noites de Sexta,20, e Sábado, 21. Os dois Seminários caracterizaram-se pela fala em torno de termos conhecidos na logicização psicanalítica: "Sintomas e Repetição" e "O Fecho e o Fechamento em Psicanálise". O segundo Seminário, assistido por este repórter inexperiente, circulou sobre as vertentes finita e infinita da cura psicanalítica. E Laurent com a formulação "infinita atual" buscou definir, de maneira nova, o impasse entre ambas vertentes. Na escuta deste repórter, Laurent defendeu a perspectiva de que a cada instante, a cada pontuação, a cada sessão o infinito da análise se presentifica, ao lado possibilidade de conclusão, e cabe ao psicanalista e cabe ao analisante a direção que aí é dada. Direção qualquer, desde que produza conseqüência e o significante balize e o gozo revele.

Enfim. O XI Encontro acabou. Encerrou-o Maria do Carmo Dias Batista, coordenadora do Encontro e Presidente da Es cola Brasileira de Psicanálise. Uma fala emocionada.

Não há como evitar, é mais forte que cada eu, a impressão de que algo muito importante se deu mas que, ao mesmo tempo, algo muito importante se perdeu. A vida continuava enquanto rolavam as falas, o afazeres do dia a dia permanecem. Na incessante repetição de continuar a analisar e a fazer do significante "Psicanálise" uma presença "perturbançosa " – perturbadora e esperançosa – na cultura de Deus morto e de Ciência – invenção dos irmãos – viva.


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